Existem vários motivos para uma criança recusar alimento. É cada vez mais frequente nos consultórios médicos as queixas de mães sobre os distúrbios no apetite e preferências alimentares de seus filhos na infância. A recusa e seletividade alimentar infantil pode ocorrer devido a comportamentos mais complexos por conta de características familiares, ou fatores médicos, casos vividos pela criança no início da vida. Durante o processo de crescimento ao aparecer os sintomas de recusa alimentar são encarados como “frescuras” e apenas uma “fase” infantil.
A dificuldade ou recusa alimentar pode ser enfrentada como algo esperado, desde que não afete ou retarde o crescimento nutricional e alimentar da criança. O problema está na maneira que os pais interpretam a recusa e seletividade na alimentação, causando conflitos e gerando angustia já que a alimentação está ligada a sobrevivência. Então, a introdução de novos alimentos durante o desenvolvimento alimentar, exige dedicação dos responsáveis para não criar maus costumes, afetando a saúde da criança.
Hábitos alimentares fazem partes das etapas de crescimento. Então o ambiente durante a refeição pode ajudar de forma positiva ou negativa nessas etapas. As refeições devem se tornar atrativas ao olhar curioso da criança, como alimentos variados, com vários formatos e cores.
É fato que durante as refeições a criança ao recusar o alimento chore, faça birra e isso acabe gerando brigas e chateações. O medo a introdução de novos tipos de alimento, com diferentes consistências, pode gerar atraso no desenvolvimento alimente, e consequentemente alterações na fala e desenvolvimento dos ossos e músculos da face. A recomendação é que os pais procurem ajuda de um Fonoaudiólogo quando da identificação de alguma dificuldade alimentar na criança.
Para entendermos melhor sobre o assunto, o Dr. Cleyton Amorim, coordenador serviço de Fonoaudiologia do Hospital São Domingos irá explicar alguns fatos.
HSD: Como identificar os aspectos que influenciam a habilidade da criança de comer e beber alegremente e com eficiência?
Dr. Cleyton: Diversos aspectos influenciarão na aceitação de novos alimentos. Desde aspectos físicos, psíquicos, sociais e ambientais. Tudo isso deve ser considerado no momento da avaliação e diagnóstico. Se a criança não aceita a introdução de novas consistências, o caso deve ser avaliado precocemente.
Temos que lembrar sempre das fases do desenvolvimento alimentar e quando introduzir novas consistências
Entre 4 e 6 meses: ofertar texturas mais homogêneas (purês)
Entre 6 e 8 meses: adicionar textura com grumos, não tão homogênea
A partir dos 8 meses: alimentos com pedaços macios
A partir dos 10 meses: com maior controle oral do alimento, a criança consegue aceitar frutas suaves e vegetais cozidos. Com 1 ano de idade, a coordenação da mastigação está desenvolvida.
A partir dos 18 meses: a criança é capaz de aceitar diversas texturas, adquirindo controle total da mastigação por volta de 2 ou 3 anos.
Na prática clínica observamos crianças a partir dos 3 anos, ainda aceitando apenas alimentos liquidificados, o que caracteriza um atraso no desenvolvimento alimentar. Ela deve passar por todas as etapas, com diferentes consistências para que possa aceitar os novos alimentos. Tudo isso, é um aprendizado como andar ou falar.
HSD: Qual a diferença entre seletividade e dificuldade alimentar?
Dr. Cleyton: Dificuldade alimentar infantil é um ato complexo, genérico que engloba a seletividade, a recusa ou aversão alimentar. Na seletividade alimentar a criança pode selecionar alguns alimentos pela marca, cor, tamanho, formato ou sabor.
HSD: Como compreender os motivos pelos quais a criança se recusa a comer?
Através de avaliação clínica especializada, procurando sempre conhecer a causa da recusa alimentar. Várias são as causa, como: refluxo gastroesofágico, disfagia, comportamental, histórico de prematuridade ou internação prolongada em UTI, alergia alimentar, causa neurológica, respiratória ou cardíaca.
HSD: Como a saúde da criança tem impacto no apetite?
Dr. Cleyton: Várias são as causas da recusa ou seletividade alimentar, devemos investigar a origem da recusa e tratar a causa.
HSD: O ambiente de refeição interfere no apetite da criança?
Dr. Cleyton: Sim, quando a criança apresenta dificuldade alimentar, a mãe pode apresentar: ansiedade, nervosismo ao ofertar o alimento e com isso, utilizar artifícios como: distrações, músicas, alimentar a criança andando pela casa, oferecer recompensas, outros alimentos. O que, não é recomendado, podendo retardar ainda mais a introdução de novas consistências.
HSD: O funcionamento das estruturas orais impacta no desenvolvimento alimentar?
Dr. Cleyton: Impacta e são impactadas. A mastigação é essencial para o desenvolvimento dos músculos e ossos da face, quando não introduzimos novas consistências alimentares, podemos apresentar alterações estruturais e consequentemente na fala. Por outro lado, se a criança apresenta alguma alteração na musculatura orofacial e pode não conseguir mastigar de forma eficiente.
HSD: Quais os fatores necessários para o desenvolvimento no aprendizado da mastigação?
Dr. Cleyton: A mastigação é uma função aprendida, como andar ou falar. A criança precisa de estruturas orofaciais funcionando adequadamente, bem como do funcionamento adequado do cérebro, fatores ambientais e comportamentais.
HSD: Crenças maternas refletem na alimentação da criança? Como?
Dr. Cleyton: Bastante, a criança precisa do modelo de alimentação da família. Por isso, é de suma importância a alimentação na mesa juntamente com a família. Se os pais não têm uma alimentação diversificada, a criança geralmente não terá.
HSD: Existe o impacto das emoções no desenvolvimento alimentar?
Dr. Cleyton: Sim, principalmente por influência do comportamento da mãe ou outra pessoa que oferta o alimento para a criança
HSD: Como dar suporte às famílias e obter sucesso do tratamento?
**Dr. Cleyton:**É muito importante um diagnóstico clínico adequado, identificando as causas da dificuldade alimentar. A adesão ao tratamento, o tratamento deve ser em conjunto com a família na mudança de comportamento e hábitos.
HSD: Como motivar a criança a ampliar suas escolhas alimentares?
Dr. Cleyton: Participando das refeições com a família, ajudando na elaboração com cardápio e preparo dos alimentos. Manipular os alimentos desde cedo. Mas, as vezes não é tão simples chegar a essa fase. Por isso a necessidade de uma avaliação Fonoaudiológica minuciosa. Tudo deve acontecer de forma gradativa de prazerosa, nunca force a criança a aceitar o alimento.