*José Raimundo Azevedo
A expectativa de vida da população tem aumentado de forma expressiva. Em 1850, a expectativa de vida do ser humano era de pouco mais de 40 anos. Em 1950, a expectativa já era em torno de 60 anos e, hoje, em países do primeiro mundo, chega aos 85 anos. Nos últimos 30 anos, a expectativa de vida da população aumentou em pelo menos sete anos.
Quais são os determinantes dessa melhora? São vários os fatores: o progresso social e econômico; a redução da mortalidade infantil, fortemente influenciada pala melhora da nutrição e a redução da mortalidade por doenças crônicas influenciada por mudanças nos hábitos alimentares. Diferentemente do que geralmente se imagina, o progresso médico teve impacto menor que os outros fatores relacionados.
Um estudo realizado na Suécia, que avaliou a saúde cardiovascular da população daquele país no período de 1986 a 2002, mostrou que as doenças cardiovasculares tiveram redução da ordem de 40%. Os autores do estudo identificaram que o que mudou foi o perfil lipídico da população, a redução do tabagismo e mudança nos hábitos dietéticos com redução substancial do teor de colesterol da alimentação.
Se nos anos 20 as pandemias tiveram impacto na longevidade da população mundial, nos anos 90 a grande epidemia foram as doenças cardiovasculares e o câncer. A epidemia do século 21 é o envelhecimento. A prevenção e tratamento de várias doenças trouxeram como consequência a longevidade, entretanto propiciou o aparecimento dos dois grandes males do nosso tempo: a demência e a perda de função, conseqüências do envelhecimento.
O envelhecimento é multifatorial e uma abordagem preventiva e terapêutica é complexa porque os fatores são diversos e frequentemente não relacionados. Vão desde a perda de telômeros cromossomiais, disfunção da mitrocôndria, exaustão de células tronco ( mãe de todas as células) e um determinante importante e que só passamos a reconhecer recentemente: o envelhecimento é uma doença inflamatória.
Nenhuma intervenção terapêutica tem tanto impacto nos vários fatores relacionados ao envelhecimento quanto a nutrição. Aprendemos que nutrientes específicos têm impacto significativo sobre os dois grandes problemas do envelhecer: a perda de função e da cognição (demência).
Sabemos, por exemplo, que a ideia de que o idoso tem resistência anabólica não é verdadeira. Na verdade, idosos necessitam e são capazes de incorporar proteínas em quantidade tão elevada quanto 2 gramas por quilograma de peso por dia (adultos consomem em média 0,8 a 1 grama por quilograma por dia) e esta incorporação trará ainda mais benefícios se forem incluídos aminoácidos essenciais, em particular a leucina. Dieta e exercícios podem propiciar manutenção da função. O que se quer dizer é que uma dieta com elevado teor proteico se associada a exercícios regulares e orientados, propicia ao idoso aumento da massa muscular e também melhora do desempenho físico.
A prevenção da perda cognitiva do envelhecimento também passa pela dieta. Vários estudos populacionais já mostraram que a chamada Dieta Mediterrânea ( consumo elevado de peixe, frutas, vegetais e frango, baixo consumo de carne vermelha, laticínios ricos em gordura e manteiga) reduz de forma expressiva o aparecimento de doenças crônicas incluindo mal de Alzheimer e a doença de Parkinson). O benefício da Dieta Mediterrânea certamente tem muito a ver com controle da inflamação, já que os ácidos graxos ômega 3, que têm atividade anti-inflamatório intensa, são abundantes nesta dieta.
Portanto, viver mais é, sem dúvida, o sonho de todos nós, desde que possamos manter a condição física e também, muito importante, a mente em boas condições.
Outro aspecto importante na prevenção das sequelas do envelhecimento diz respeito à restrição calórica. O estudo mais relevante neste campo foi realizado na Universidade de Wisconsin (EUA) e foi publicado em 2009 na prestigiada revista Science. Macacos Rhesus foram submetidos a dois regimes dietéticos diferentes, um grupo recebeu dieta livre em quantidade normal e um grupo recebeu uma dieta com 30% de restrição de calorias. Os animais foram acompanhados por 20 anos e a longevidade e doenças crônicas (diabetes, aterosclerose) foram expressivamente reduzidas nos animais submetidos a restrição de calorias.
Vivemos hoje a epidemia do século 21. Avançamos muito nos últimos anos no conhecimento sobre o processo de envelhecimento e, se ainda não temos o elixir da juventude eterna, sabemos hoje que é possível através da alimentação viver mais e, mais importante mantendo o vigor físico e a mente em boas condições. A fórmula mágica da vida longa e com saúde é a alimentação inteligente baseada nas melhores evidencias cientificas atuais.
Finalmente, o que recomendar para reduzir a ingesta de calorias? As soluções atuais vão desde jejum, que pode ser representado de forma simples por só se alimentar durante o dia, ou restringir calorias dois dias da semana, ou ainda com intervenções farmacológicas que ficam fora do escopo deste texto. E por ser este assunto tão instigante e essencial é que o Hospital São Domingos promoverá o Simpósio de Atualização em Nutrição Clínica, que ocorrerá no dia 21 de novembro, às 18h, no próprio hospital. Será uma grande oportunidade de discutirmos a importância da nutrição para os pacientes em tratamento de diversas enfermidades.
*José Raimundo Azevedo é médico, coordenador da Equipe Multiprofissional de Terapia Nutricional do Hospital São Domingos e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral.